10 anos de ensaios e análise da relação entre mercado e certificação de sprinklers mostra importância do futuro da indústria brasileira diante da globalização
Se determinados produtos circulam no mercado é porque existe consumidor para financiar o giro. Tanto faz se o produto é lícito ou não, se é original ou pirata ou, como no caso de sprinklers, se é qualificado através de certificação ou não.
A constatação acima é básica, quase óbvia, contudo, traz para o debate uma provocação sobre as consequências da circulação de produtos nocivos ao consumidor final, sem que o mesmo tenha a menor ideia sobre os riscos a que está exposto.
Talvez por isso, para evitar prejuízo à sociedade, tornou-se necessária a existência de especialistas, fóruns, debates, estudos, controles de qualidade, associações, leis e órgãos fiscalizadores; seja do Estado ou da sociedade civil.
No caso específico dos sprinklers (chuveiros automáticos de combate ao incêndio) no território nacional brasileiro, esse debate com a sociedade e o Estado, principalmente através da Associação Brasileira de Sprinklers (ABSpk), já cruzou a marca dos 10 anos, com poucos avanços computados nesse período.
Porque será que um assunto tão consolidado em outras partes do mundo, persiste no atraso aqui no Brasil?
A resposta também é simples: por conta da inexistência de legislação sobre os parâmetros de qualidade em sprinklers.
A legislação brasileira, referente a projetos de segurança contra incêndio, exige sprinklers nas edificações, mas deixa uma “avenida” de oportunidades para produtos que derretem, entopem ou quebram, a qualquer momento, imprevisto, entre a instalação e sua necessidade de operação.
Por menor que seja o setor de incêndio, ou a cadeia produtiva dos sprinklers, existe publicamente, há pelo menos cinco anos, um estudo que embasa de forma criteriosa a implantação de lei e portaria para organizar a qualificação do produto sprinkler. Não me refiro à cadeia de incêndio, como um todo, e nem mesmo à cadeia produtiva dos sprinklers (válvulas, conexões, tubos, bombas, chaves de fluxo), mas somente ao PRODUTO sprinkler. Faço esse destaque, porque, do ponto de vista estratégico do setor, tratar a questão de qualificação do sprinkler à luz do pacote de produtos de incêndio tem sido uma das maiores barreiras ao avanço do tema.
O estudo realizado, premiado e publicado pelo Instituto Sprinkler Brasil (ISB) – em seu 4o Prêmio Literário [Certificação de Produtos de Segurança Contra Incêndio] pelo Ten. Coronel Marcelo Alexandre Cicerelli, atestou a existência de uma estrutura de mercado, de normas técnicas e certificadoras capazes de absorver uma primeira legislação via Corpos de Bombeiros para os sprinklers (chuveiros automáticos de combate ao incêndio).
A implantação desse procedimento legal, viável desde 2018, certamente traria aos dias de hoje uma trilha de sucesso e conhecimento, empolgando o empresariado do setor, que ainda permanece resistente à certificação e, por consequência e falta de visão estratégica, contra qualquer tipo de legislação sobre o assunto.
É o típico protecionismo do atraso em que, não à toa, vive grande parte da indústria nacional, bem-sucedida em suas décadas de lobby no Congresso e nas Assembleias Legislativas do país.
Sem legislação sobre o assunto, a sociedade só pôde “contar” com a auto contenção do mercado, ou seja, com a consciência empresarial de que vender #sprinklertampão não é ilegal, mas é imoral, já que eles derretem ao invés de proteger o usuário do recinto.
A sociedade não quer “contar com a sorte”, muito menos sem um alerta de que estão sob risco. As pessoas querem responsabilidade de quem fabrica, vende, instala e deveria garantir a segurança contra incêndio aos leigos usuários. Sugiro que assistam os documentários sobre a boate Kiss para entender melhor meu argumento nesse artigo.
Não devemos tratar o assunto como piada, deboche ou “síndrome de vira-lata”, mas lá se foi uma década de debates, enquanto 25% do mercado nacional de sprinklers de baixa vazão foi dominado pelos sprinklers sem certificação, ou melhor, pelos tampões de Zamac.
E o consumidor?
Leigo no assunto, naturalmente, não sabe o risco a que está exposto.
Chegamos, portanto, ao ponto onde:
- O próprio empresário do incêndio briga contra a qualificação certificada de produtos de proteção ao usuário;
- Os órgãos de Estado não entendem a dimensão do problema, sofrem pressão contra do setor e, naturalmente, não priorizam a parametrização da qualidade via legislação;
- A auto contenção privada é um fracasso, diante do volume de produtos sem qualidade instalados na última década, fazendo com que, por consequência, a concorrência esteja orientada, em grande parte, para a guerra sangrenta de preços nos sprinklers de baixa vazão.
Esses fatos enfraquecem ainda mais a auto contenção privada. Um exemplo recorrente dessa auto contenção fragilizada é a mistura, em orçamentos e edificações, de sprinklers sem certificação com produtos certificados, para a formação de um preço médio competitivo. Essa prática, que se normalizou entre algumas instaladoras e diversos balcões de revendas, agravou-se bastante com a estagnação da Economia brasileira nos últimos anos.
Quanto mais esse cenário avança, mais acirrada a concorrência e menor a auto contenção privada. As consequências da manutenção desse quadro, ao meu ver, são duas e já estão em andamento no Brasil:
Alargamento da imoralidade e dos riscos:
Sem legislação que embase um processo no MP, porque não vender produto “pirata”? O que já era de se esperar está concretizado e resultou num boletim de alerta da FM Approval, em setembro de 2023, em relação a dois modelos falsos de sprinklers de alta vazão (para armazenagem industrial), circulando no Brasil em grandes quantidades, como se fossem fabricados pela respeitada marca Tyco.
O produto “pirata” simula uma concorrência como se fosse do segmento de produtos qualificados (certificados), diferente dos sprinklers declarados sem certificação, ludibriando aqueles que optaram pela qualidade certificada na segurança contra incêndio. A pirataria é o esgarçamento do #sprinklertampao, muito mais sério e preocupante.
Indústria nacional enfraquecida e desvalorizada:
Produtos de qualidade certificada, vindos da Ásia, já chegam ao Brasil a preços iguais ou até melhores que os produtos brasileiros resistentes à certificação. E agora, como fará o empresário brasileiro? Vai colocar a culpa no Estado por não impedir a “globalização” ou vai sonhar com algum tipo de isenção fiscal, quando, nesse exato momento, o rumo da Economia brasileira caminha para o lado oposto?
Os sprinklers do boletim de alerta da FM referem-se a descobertas de pirataria na Índia, Arábia Saudita e Brasil. Estar nesse “clube” não é mais um bom motivo para mudarmos o rumo da história de uma vez por todas?
Deixo essa provocação, na esperança de que haja avanço (rápido) na contenção externa desse cenário vergonhoso, através de legislação do Estado sobre os parâmetros da qualidade para os SPRINKLERS (chuveiros automáticos contra incêndio) vendidos e instalados no Brasil; visto que a moralidade, a inteligência e a capacidade do mercado de concorrer globalmente, em seu próprio país, perderam para a forma como o mesmo se auto regulou nos últimos 10 anos.